Christina Ramalho
O
meu amor tem um jeito manso que é só seu…
(CHICO BUARQUE)
Para
onde me levam os passos do homem que sigo como as transparentes águas do rio
obedecendo a seu leito? Para onde me leva este amor envolvente e terno como o
aconchego maternal que nos surpreende e resgata nos momentos de dor? Como
distrair o pensamento em coisa outra qualquer que não a doce fluidez de tua
essência se derramando em mim? Como reinventar o tempo distante, como ter
outras lembranças, se não me reconheço fora do que a tua presença me trouxe de
espelho? Serão necessárias as perguntas, quando meus poros respiram o sim que
meu peito reflete? Poderão ser mais sinceras quaisquer respostas que a
intraduzível verdade que vibra as cordas da minha emoção? Perguntas, meu A.Mor,
apenas perguntas que brotam da atmosfera de música e poesia em que te encontro.
Perguntas, amor, apenas perguntas sábias de respostas, perguntas que querem
dizer todas as certezas nas entrelinhas das interrogações.
Não.
Minha vida está imersa em sonho, e não há perguntas, nem há respostas – há
única e exclusivamente a seda de tua pele, a melodia de tua voz, a infinita
beleza de tua sensibilidade e, mais que tudo, há o teu amor, presença mor e
mais valiosa. Deixa, portanto, que eu te diga hoje, meu querido, aquilo que não
é pergunta, nem resposta. Deixa que eu te presenteie com o que o poeta jamais
alcança, com o que o compositor persegue durante toda a vida, com o que o
pintor busca alcançar até a última pincelada. Deixa que eu te presenteie com o
que eu mesma seria incapaz de tocar com a sensibilidade e transformar em
presente; com o que não é lago, nem peixe; barco, nem porto; casa ou ruína; e
também não é estrada, estação; rotina, ou identidade. Mas, apenas e justamente,
o que está no meio de tudo e que, por isso, é o tudo.
Assim,
eu te dou todas as impossibilidades vivenciadas e as músicas encarceradas no
silêncio; as flores, a lembrança das flores e a lembrança do aroma das flores;
o mistério, a luz, a escuridão e a tempestade, e mesmo o sofrimento e o medo,
porque em todas essas coisas sonho e vida se misturam e dão origem a algo que
me parece semelhante com o que me deste: esta intraduzível certeza de estar
completa. Eu sou tua menina, viu? Tu és o meu rapaz. Corpo e alma testemunham o
bem que este amor me faz.